A lua está quebrada


e o céu está rachado


Suba para dentro da CASA

1/28/2009

The Piano Has Been Drinking (Not Me) (An Evening With Pete King)

"O piano esteve bebendo (e não eu) (uma noite com Pete King*)"




O piano esteve bebendo, minha gravata está dormindo
A banda (de jazz!) voltou para Nova Iorque,
a jukebox precisa mijar
O tapete precisa de um corte de cabelo,
e a luz do holofote parece uma saída da prisão
pois o telefone está sem cigarros, e a varanda está excitada

E o piano esteve bebendo... o piano esteve bebendo, e os menus estão morrendo
de frio
o cara da iluminação é cego de um olho
e não enxerga com o outro
o afinador do piano usa um aparelho auditivo,
ele apareceu com sua mamãe
e o piano esteve bebendo

enquanto o segurança é um lutador de sumô, um Casper Milquetoast** afeminado, o dono do lugar é um anão retardado com o QI de um poste

pois o piano esteve bebendo

E não dá pra achar sua garçonete com um detector de radiação
e ela te odeia, e também odeia seus amigos - mas você não pode ser servido por nenhuma outra!
o caixa está babando, e os banquinhos estão pegando fogo
os jornais estavam mentindo (oh!),
e os cinzeiros se aposentaram
pois o piano esteve bebendo

o piano esteve bebendo, e não eu.


(The Piano Has Been Drinking - Small Change)


*Pete King é um saxofonista inglês. E só. Quem quiser saber mais, consulte o oráculo de Delfos

**personagem tímida e humilde de uma tira publicada em jornal norte-americano (hífen... ou não hífen? Ai meus deuses!), chamada The Timid Soul (a alma tímida). Milquetoast é uma referência a milktoast - torrada com açúcar, leite e manteiga derretida - refeição boa pra crianças, bem fácil de digerir. Também é considerada a refeição dos inválidos, ou daqueles que possuem estômago fraco. Segundo o autor da tira, sua personagem era um homem que falava suavemente e apanhava com um grande porrete. Acho que já deu pra entender a idéia por trás do uso desse nome...



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Agora, assistam o espetáculo triste acompanhado de risadas:
http://br.youtube.com/watch?v=-gwUtEEjZJ8

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Acho que o título já diz o suficiente. Ou talvez não.



Bom, prosseguindo... o cenário é um bar, ou qualquer local que nos permita ouvir jazz e encher o saco da nossa garçonete preferida depois de bêbados. "Bêbados" é a palavra-chave. Todo esse teatro lunático de objetos inanimados ocupados com suas prosopopéias parece ocorrer em um momento de desmontagem - quase de manhã, se for um bar quase decente. A banda já voltou pra casa e a jukebox precisa se livrar do que foi consumido durante a noite. E acabaram os cigarros. Está quase na hora de fechar, e as coisas não realizam mais suas funções - e lá se vai aquele modo de ser que é a manualidade...? Ah, esquece.

Agora, o mais importante - o cantor está bêbado. Não, na verdade, é o piano que está. Mas o piano é o "eu lírico". Os outros objetos, de certa forma, também são. Em alguns momentos, Tom parece querer jogar a responsabilidade toda para o que está a sua volta. Não era ele quem estava bebendo, afinal. Em outros momentos, parece que quer dar vida a todos esses objetos simplesmente por estar terrivelmente solitário. É como ter um amigo imaginário, algo bem normal (eu espero). Talvez o fato de estar solitário seja o motivo para querer trasferir seus problemas para os objetos do local. É o piano que esteve bebendo durante a noite inteira... é o telefone que precisa de cigarros... é o tapete que precisa cortar o cabelo e dar um jeito em sua aparência de indivíduo acabado.

De qualquer forma, o mundo é constituído de meros modos da substância alcóolica única, que seria Tom Waits, e todos esses pobres objetos sem vida e funcionários deformados de um bar estariam nele, e nada fora dele. Aha, uma nova modalidade de delírio, o delírio espinosiano!





As pessoas da música, como o segurança e o afinador do piano, são todos seres bizarros... degenerados, inferiores. Nem mesmo são capazes de desempenhar sua função, devido às suas deformações (um segurança tímido e humilde! Que mundo é esse?!!). Menos a garçonete, é claro. Pelo menos, é o que parece. A garçonete não está contaminada, não pode ser encontrada com um simples detector de radiação. De qualquer forma, ela te odeia, e você depende totalmente dela. Talvez seja a parte mais real desse espetáculo de pianos bêbados e telefones desesperados por cigarros. Mas, vejam, os jornais estão mentindo. Parece que a coisa toda não é tão surreal assim. Talvez seja uma pista!

Ou... talvez seja tudo efeito do álcool (ora, mas não é o álcool que bota a verdade pra fora?? Ou seria somente o pentotato de sódio? Ou aquela poção do Harry Potter?? Oops... fui longe demais). De qualquer forma, não dá pra confiar muito em um piano bêbado. Veja como a voz de Tom Waits e o piano se combinam pra imitar um bêbado cambaleante. Bom, é tudo culpa desse piano bêbado. Eis a solução! Ninguém precisaria interpretar essa música se o piano estivesse sóbrio. O único culpado por esse devaneio é um piano bêbado. E não eu.

3 comentários:

maria lucia disse...

olá, você é um poeta bem corajoso.
um abraço

GALDINO, V. disse...

Obrigado... eu acho.

Filipe Völz disse...

Eu notei que vc escreveu "não-hífen" sem o hífen. Genial!

Poeta corajoso... hhahaha